Estive no Rio de Janeiro neste verão e me hospedei em
Copacabana, num ótimo hotel da Rua Xavier da Silveira. No primeiro dia,
passeando pela Avenida Atlântica, minha companheira falou em tomarmos um café
no Copacabana Palace. Nada mais do que um café no Pérgula do hotel, ao redor da
piscina. Na verdade, um simples cafezinho. Da outra vez que estive lá inventei de pedir
uma taça de vinho branco e paguei o preço de uma garrafa. O vinho era bom,
claro, mas não valia tudo aquilo. O local, no entanto, puxa vida, era de
cinema.
E continua sendo, constatei mais uma vez. Nessa oportunidade,
uma moça caminhava de maiô inteiro, azul, lá na outra ponta da piscina, e era
como se desfilasse. Alvoroçada, cheia de gestos, vestia uma espécie de saída de
banho branca e transparente, esvoaçante, e andava entre as mesas, saia em
direção ao prédio dos fundos, entrava, saia, voltava a andar entre as mesas, e tive
a impressão de que protagonizava uma encenação. Uma performance, quem sabe.
Minha companheira chamou minha atenção para uma mulher
que se deixava fotografar próxima a nós, com muitos brincos, pulseiras e
colares, e percebi que era outro espetáculo. Fiquei atento. A mulher pousava
puxando os cabelos para trás, indicando o detalhe dos brincos, e depois mudava
de pose, as mãos na cintura, e parecia dizer para a fotógrafa que agora era ali
que ela devia focar.
– Uma styler influence – imaginamos.
Vendendo balangandãs, eu pensei (compraria uma biografia da Carmen Miranda naquela
semana).
O garçom nos serviu os cafezinhos e notei que as
xícaras não tinham alças. Coisa estranha, mas deve ser a tendência ou
coisa assim. Peguei a xícara com uma das mãos (ou copo ou sei-lá-o-quê), me
recostei na cadeira para beber e lá estava a moça do maiô azul sentada na mesa
defronte. Ela, mais outras duas, todas jovens, bonitas e maquiadas, reunidas a três
homens velhos, feios, um deles sem largar o celular.
As jovens empunhavam taças de espumante (ou seria champanhe o que elas bebiam?), riam e falavam entre si. Os homens conversavam também entre
si, sem risos, um deles sempre com o celular. Minha companheira e eu nos
olhamos e acho que pensamos a mesma coisa: acompanhantes, garotas de programas?
Sei lá, mas não falamos nada pra não pegar mal e ficamos observando o cenário: o
azul da piscina, o entardecer, a fauna sofisticada, essas coisas.
Na madrugada de hoje revi Pixote – a lei do mais
fraco (no Canal Brasil) e me acordei pensando no Copacabana Palace... O
que será que o Pixote, a Lilica, o Dito e Chico (personagens do filme) achariam
desse hotel?
Explico melhor: Pixote, Lilica, Dito e Chico são os
meninos que fogem do reformatório em São Paulo e vão para o Rio de Janeiro vender cocaína. Eles imaginam que vão se dar bem e se dão mal, claro.
Uma cena antológica: os meninos estão na Pedra do Arpoador,
assistindo o entardecer na Praia de Ipanema e sonham acordados a respeito do
que vão fazer quando meterem a mão na grana resultante da venda de cocaína... Os meninos
divagam, a Lilica canta “Menino do Rio”, e a cena releva o quanto eles são estranhos
naquela paisagem carioca, um território de alta classe média.
Exagerando a analogia, diria que lembrei do Pérgula do
Copacabana Palace porque me senti como os meninos do filme: um alienígena num
território estranho. Um exagero, claro. Era outro o filme que eu estava encenando. Minha
companheira e eu formávamos um casal de turistas de classe média e apenas usufruíamos um dos diversos cenários do Rio de Janeiro. Nada de mais. Um dia na Pérgula do
Copacabana Palace, outro no Angu do Gomes, outro na barca para Niterói.
Quando fui pagar a conta, o garçom perguntou se eu
queria que lançasse nas despesas do quarto. Sem
pestanejar, eu disse que não e abri a carteira. Aprendi a me comportar no universo dos bacanas. Me tornei um personagem de filme, talvez: o turista metido, o poeta da província, conferindo os mais diversos cenários. Nesse caso, um território da mitologia carioca.
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