sexta-feira, 25 de fevereiro de 2022

Um susto

            Domingo retrasado, acordei da sesta e não me senti bem. Um mal estar vago, corpo quente e garganta irritada. Tirei a temperatura, constatei 38 graus e disparou o alerta. Conversei com minha companheira e fomos ao hospital fazer uma consulta de emergência.

Não deu outra: o médico achou que eu estava com sintomas de covid e me receitou analgésico e remédio para a garganta. Acrescentou medicamentos para coriza e tosse, que ele disse que surgiriam nos próximos dias. Me deu requisição para exame na quarta-feira (72 horas depois dos primeiros sintomas) e, até lá, recomendou isolamento total.

Antes que eu fizesse o exame e saísse o resultado, o mal estar no corpo passara, a febre desaparecera e a garganta se normalizara. Com o resultado nas mãos, a prova: apenas um susto. O vírus não foi detectado.

Não cheguei a me preocupar (nem perdi o sono), mas teria sido diferente se tivesse vivido isso antes da vacina (da primeira, segunda e terceira doses). Antes dessa mudança no enfoque da doença (certamente como resultado da CPI da Covid, no Senado Federal) e o abandono das alardeadas hidroxocloroquina, azitromicina e outras medicações propagandeadas pelo “doutor Bolsonaro”. (Sim, juro que ouvi um bolsonarista se referir ao capitão reformado como “doutor”.)

Foram tempos duros os que vivemos no país – de forte negacionismo em relação a peste, desconfiança em relação às vacinas e com autoridades médicas endossando o gerenciamento equivocado da doença feito pelo Governo Federal, incluindo nisso um tratamento (o famoso “kit covid”) sem o devido embasamento científico. Tempos em que muitos médicos da minha pacata Santa Maria (mais de 200 profissionais) assinaram manifesto a favor do tratamento precoce e deixaram muitos de nós, leigos, temerosos. Muitos desses médicos, por sinal, atuando no hospital onde fui consultar...

         Felizmente a conjuntura mudou e até o Ministério da Saúde, em julho do ano passado, reconheceu a ineficácia do “kit covid”. Aos trambolhões a vacinação se difunde – mesmo a vacinação infantil – e entendo que vivemos um arrefecimento do negacionismo em relação a covid. Uma avaliação otimista, alguém dirá. Mas vivi com tanta naturalidade esse susto (a possibilidade de ter pego o vírus), que assino embaixo: a conjuntura nacional mudou em relação ao negacionismo. O bolsonarismo continua uma força política considerável, mas, em relação a peste, parece ter recuado.

Vista da sacada do meu apartamento, uma paisagem
que se tornou mais presente nesses tempos de peste.



quarta-feira, 23 de fevereiro de 2022

Caminhada na Estrada do Perau

           Dias atrás (6 de fevereiro) desci com meu grupo de caminhada a Estrada do Perau, mas meu joelho direito não gostou. A Estrada tem pouco mais de cinco quilômetros, é bastante íngreme – liga a região do Planalto Central (Pinhal, atual Itaara) à Depressão Central (Santa Maria) – e exige boa musculatura nas pernas. Não foi o meu caso (faltou muque) e terminei a jornada mancando.

Fui ao reumatologista, ele não constatou nenhum problema (o início de uma artrose, talvez, coisa da idade ou do reumatismo não sei) e me mandou ao fisioterapeuta.

– Pra fortalecer a musculatura e voltar às caminhadas – ele disse.

Foi mais ou menos o que a fisioterapeuta avaliou e hoje volto para a terceira sessão. Não quero deixar essa atividade física tão prazerosa: pernear pelas ruas, estradas, desertos e praias.

A Estrada do Perau foi aberta durante o período farroupilha pelo governo republicano (por volta de 1840) e era chamada Picada do Pinhal. Tinha a largura suficiente para uma carreta e, segundo consta (informações orais, mais leitura do Diário de Santa Maria), os farroupilhas pensaram a estrada como uma via alternativa ao tradicional caminho de São Martinho da Serra (aberto no século XVIII, no tempo das Missões Jesuíticas e dos embates entre os impérios de Portugal e Espanha na região).

Durante o período farroupilha, tornou-se uma alternativa para enviar tropas da região da Campanha (onde se localizaram as capitais da República Sul-Riograndense) para Cruz Alta (no Planalto). Tempo de guerra, de lutas entre gaúchos republicanos e as forças do Império do Brasil, até hoje relembrado pelos centros tradicionalistas – como bem comprovaram, naquele dia de caminhada, o grupo de gaúchos que cavalgavam na estrada e cruzaram por nós.

Grupo tradicionalista subindo a Estrada do Perau.

Em 1942, a estrada foi pavimentada por paralelepípedos, na década de 1980 abrigou um “motel ao ar livre” (estacionamento pago para o pessoal ir de carro namorar e transar) e se tornou um “território mágico” para os santa-marienses. A estrada é pitoresca, apresenta desafios para motoristas que gostam de testar suas habilidades, preserva traços da Mata Atlântica, tem vistas bonitas de Santa Maria e da Garganta do Diabo (hoje com outro nome, que eu me nego utilizar) e recentemente foi revitalizada. A estrada foi limpa, os mirantes passaram por reformas (com pintura de murais muito criativos) e aumentou a sua frequência.

A Garganta do Diabo, vista do terceiro mirante
da Estrada do Perau.

Meu grupo de caminhada se inseriu nessa revitalização da estrada e, no domingo retrasado, desceu bravamente o caminho. Minhas colegas se saíram muito bem, mas eu fraquejei. Acredito, porém, que a fisioterapia vai me restabelecer e logo as caminhadas nos espaços íngremes não serão mais problema.