domingo, 23 de setembro de 2012


Violeta foi para o céu

As canções da chilena Violeta Parra fazem parte do repertório de muitos de nós, especialmente daqueles que viveram o movimento estudantil dos anos 70. Era comum nos diretórios acadêmicos se ouvir as canções de Violeta Parra, assim como as de Mercedes Sosa, Chico Buarque e Gonzaguinha. “Me gustan los estudiantes” (“aves que no se assustan / de animal ni policia”) mais “Gracias a la vida” (“que me ha dando tanto... / me ha dado la risa y me ha dado el llanto”) me parecem representativas das composições de Violeta, uma artista enraizada no folclore chileno, vinculada às lutas populares latino-americanas e também ao Partido Comunista.
Com essas lembranças, fui assistir ao filme Violeta foi para o céu (Violeta se fue a los Cielos), de Andrés Wood (Chile, 2011, 110 min.), que está em cartaz na cidade. O filme é do mesmo diretor do excelente Machuca, baseia-se em livro escrito por um filho da cantora (Ángel Parra) e surpreende quanto ao modo como aborda a vida da cantora, compositora e artista plástica.
Uma narrativa que não romantiza a artista. Não trata a sua trajetória de forma linear e opta por uma estrutura fragmentada de representação de sua infância, amores e obstinações, tudo isso articulado por suas canções. Um filme comovente, duro, nada confortável e muito bonito. Uma espécie de mosaico poético da vida da cantora, com metáforas rudes e significativas: a cantora menina, suja e pobre, se lambuzando ao comer amoras; a frágil galinha solta no pátio, ameaçada por um gavião. Metáforas que são decodificados pelo próprio filme: a determinação e obstinação da cantora, que não perde sua matriz de índia pobre; a frágil galinha (a mulher, o povo sofrido) diante do gavião poderoso (as estruturas de poder e o capitalismo).
Ao contrário do que eu imaginava (como ouvinte de suas delicadas composições), Violeta não era uma mulher frágil nem delicada. No filme, é interpretada brilhantemente por Francisca Gavilón, uma artista de traços semelhantes à de Violeta e que acentua a postura simples, dura e sofrida da cantora. Talvez uma postura típica de índia - e, por isso mesmo, vista com desconfiança pela elite chilena.
Particularmente, me impactaram as cenas nas quais Violeta sai em busca de artistas populares nas montanhas, tanto para registrar suas canções quanto para aprender a cantar. Violeta não se propôs a desenvolver uma “voz acadêmica”, mas a mergulhar seu canto e sua arte nas raízes populares. Como estudante dos anos 70, foi esse traço da cantora que primeiro aprendi a admirar: sua vinculação com a arte popular. Mas não a sabia tão determinada e obstinada como o filme indica. Numa obstinação, por sinal, que a terminou sufocando-a e levando-a ao suicídio.

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