sexta-feira, 30 de março de 2012

A Dama de Ferro – o filme

O filme A Dama de Ferro não é fácil de assistir. Dá vontade de levantar, vaiar e ir embora. Mas como não sou um sujeito passional e, principalmente, porque gosto de cinema bem feito, resisti até o fim.
A película reconstitui a trajetória de Margaret Thatcher, a famosa Primeira-Ministra inglesa dos anos 80, que derrotou o movimento operário inglês, iniciou o desmonte do Estado de Bem-Estar Social britânico e liquidou, com grande saldo de mortos, as pretensões argentinas em relação às Ilhas Malvinas.
A narrativa inicia com a ex-Dama de Ferro envelhecida, lutando contra a demência, e segue intercalando esse drama de velhice com cenas de sua trajetória. Trata-se de uma velha senhora que dialoga com o marido morto e, ao mesmo tempo, recorda sua história pessoal e profissional. É por meio dessa memória que o filme reconstitui a trajetória política de Thatcher, acrescentando filmes da época e dando tom de “verdade histórica” ao relato ficcional.
Um elogio descarado à Primeira-Ministra que, junto com Ronald Reagan, foi figura chave na reconfiguração do capitalismo internacional. Uma mulher que se impôs no mundo dos homens – delicados sapatos de salto alto num universo de calçados masculinos, como a câmara acentua diversas vezes – e que, ao final, afunda no próprio autoritarismo e perde o apoio dos companheiros de partido.
Relato bastante humano no que diz respeito aos dramas pessoais da personagem (especialmente os da velha senhora que lida com a viuvez, a solidão e o passado), mas engajado de forma ufanista nas realizações políticas do governo de Thatcher. Para quem não fecha com o ideário neoliberal, um filme difícil de engolir.
Mas as cenas que me indignaram foram àquelas relativas à Guerra das Malvinas: a decisão implacável da Primeira-Ministra em defender uma colônia na América do Sul, até então considerada insignificante. O filme constrói a imagem de uma governante determinada a defender o passado colonial britânico, a não negociar com as pretensões da Argentina, e não indica o anacronismo da sua política colonial. Ao contrário, louva a sua determinação colonialista. Mas deixa a entender o quanto foi oportuna a guerra com os argentinos para criar uma coesão nacional em torno do seu governo e, a partir daí, calar a oposição parlamentar, operária e da sociedade inglesa em geral.
Espertíssima, essa Primeira-Ministra! Conseguiu aquilo que a ditadura argentina também tentava com a guerra: superar as dificuldades políticas internas. Conseguiu com enorme sucesso!
Quando a Primeira-Ministra aparece, debruçada sobre a escrivaninha, escrevendo com o próprio punho cartas para as famílias dos soldados ingleses mortos na guerra... não agüentei. A governante que aceitou a guerra – que faturou politicamente com o conflito militar – tornar-se a mãe devotada que compreende a dor dos pais que perdem os filhos?! O filme não precisava dessa cena. Gozação? Creio que não. “A face humana de uma mulher dura”, talvez tenham dito o roteirista e diretor. Seja como for, cena intolerável. Se eu tivesse um ovo, acho que jogaria na tela e iria embora. Mas agüentei.
E fiz bem. Um belo filme de propaganda de guerra! Mais uma vez, o cinema norte-americano empresta o melhor da sua arte para referendar a dominação inglesa no mundo e, de tabela, a dos Estados Unidos da América. Dessa vez, a biografia de Margaret Thatcher serviu à causa da dominação planetária. Da próxima, talvez a trajetória de George W. Bush venha a calhar. Mas aí a tarefa será mais complicada. Diretor, roteirista e ator terão de ser mais que geniais para criar um filme eficaz. Para o cinema de propaganda, é bem melhor continuar investindo na Dama de Ferro.

2 comentários:

  1. Prof, acredito que sua indignação seja mais com a política externa de Margaret do que com a película. Gostei do texto e concordo em partes, mas como no título você apresenta a idéia de expor - O filme, penso que a magnífica atuação de Maryl Streep deveria ter sido ressaltada e como tais filmes holywoodianos não pretendem ter caráter comprometedores com a ciência histórica, a ideia do ovo não cabe.
    Carlo Maia

    ResponderExcluir
  2. Parabéns Vitor! mais um excelente texto. Compartilho de suas indignações todas, achei que o filme apelou ao retratar a viúva, a demência, as complicações da velhice, para que no fim sentíssemos compaixão e principalmente tolerássemos a líder feminina que precisou ser forte para salvar a Inglaterra. Zzzz Preguiça pura! narrativamente o filme não tem nada de novo, nada demais, mais uma biografia no cinema, penso apenas que a genialidade de Merly Streep fez com que as vaias, os ovos e a critica fosse adiado para a mesa de bar mais próxima!

    ResponderExcluir