terça-feira, 20 de março de 2012

Na beira da praia

Os carros ficavam estacionados de frente para o mar, com os faróis ligados, iluminando uma pista onde a gurizada exibia suas habilidades de motorista. As gurias sentavam em cima dos capôs, se empoleiravam nos automóveis e acompanhavam tudo com interesse. Davam gritos de susto, de reprovação, mas principalmente se divertiam. E sabiam muito bem quem eram os motoristas e se eles tinham namoradas ou não.
Eu tinha 17 anos e freqüentei o local algumas vezes. Não que eu gostasse de manobras automobilísticas. Não achava a menor graça. Mas o lugar era ponto de encontro da rapaziada e era isso que eu queria: me enturmar.
Mas confesso que me entediava com o negócio. Todo mundo falava, se olhava, mediam-se uns aos outros, contavam vantagens e roncavam os motores. Lá pelas tantas alguém acelerava, fazia uma manobra ousada na pista, quase entrava mar adentro, e era um entusiasmo geral. “Tu viu só, tu viu?” Eu nunca notava coisa alguma e nem sentia curiosidade. Então ficava prestando atenção nas pernas das gurias – como havia pernas em cima dos carros, que pernas lindas! – e de repente ia embora. “Olha, eu tô indo”, avisava aos amigos. “É longe”, eles falavam. “Não importa, vou a pé”, eu respondia.
E ia, seguia pelo acostamento da estrada, era verão de 1973 e naquele ano eu iniciaria o último ano do colegial. Precisava escolher um curso, fazer o vestibular e encarar o mundo do trabalho. “Direito”, o pai propunha. E logo enumerava as vantagens da carreira de bacharel em Ciências Jurídicas, de advogado, quem sabe de diplomata do Itamaraty. Eu queria estudar literatura e história, e ele argumentava que eu teria tempo para isso, mas primeiro precisava de uma profissão que me garantisse o sustento. Coisa que eu não sabia bem o que era – o sustento –, pois achava que casa, comida e roupa lavada, isso se arranjava. Que isso não devia determinar minhas escolhas... O pai falava em inserção social, em garantias financeiras e só depois na literatura e na história.
Então eu sentia meus pés afundando na areia e seguia adiante. Avistava Tramandaí iluminada, do outro lado do rio, e achava que a coisa iria dar certo. Fazia planos de vencer, ser o melhor – esses pensamentos bobos de guri – e nem imaginava o que me esperava pela frente...

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