domingo, 8 de abril de 2012

Museu do Trem

Visitei o Museu do Trem, na cidade de São Leopoldo. Me sentei num banco da antiga estação (onde funciona o museu) e fiquei imaginando as preocupações dos ingleses quando planejaram a velha gare. Escolados pela experiência nos territórios norte-americanos, os ingleses conheciam os pele-vermelhas e sabiam do perigo de suas flechas incendiárias. Dessa maneira, construíam as estações com paredes e tetos de zinco e não foi diferente quando a Brazilian Railway inaugurou a estação de São Leopoldo, em abril de 1874.
Era a primeira estrada de ferro no Rio Grande do Sul: 33 km entre Porto Alegre e a sede da colonização alemã. Os indígenas há muito haviam sido desapropriados ou mortos. Havia bugreiros atuando na região (isto é, caçadores de índios), mas pouco se fala de combates entre os nativos e os colonos, muito menos de um ataque à estação ferroviária.
Fiquei pensando essas coisas, na tarde ensolarada de domingo, enquanto os pássaros cantavam no pátio da estação e, de vez em quando, chegavam os rangidos das máquinas do Trensurb. (O museu funciona ao lado de uma moderna estação do Trensurb.)
Tudo muito limpo e organizado ao redor da antiga estação e chama atenção as duas velhas locomotivas estacionadas no pátio. Máquinas bem conservadas, parecendo prontas para partir, em estado bem diferente daquela locomotiva e vagões que vemos apodrecendo na Gare de Santa Maria.
Talvez os peles-vermelhas tenham passado por Santa Maria, imaginei. Suas flechas incendiárias acertaram os vagões de madeira e os queimaram. Duas flechas mataram o foguista, outra feriu o maquinista, os passageiros sumiram, e a coisa ficou desse jeito: vagões destruídos, depenados, e a locomotiva apodrecendo... Restos de uma batalha onde muitos de nós perdemos parentes e amigos, e onde nossa memória se enredou.
Mas não podemos ser pessimistas. Sentado num banco da antiga estação de São Leopoldo, tive a certeza de que ao menos um lugar foi escolhido para ser o depositário da memória ferroviária. Pronto, é o suficiente. Ali a nossa memória tem condições de se organizar. Então prestei atenção nos pássaros e súbito lembrei de meu pai me indicando uma Maria Fumaça, na estação de Pelotas:
– Lá vem uma locomotiva igualzinha àquelas que teu avô dirigia.
Senti os passageiros se alvoroçarem na plataforma e todos nós – o pai, a mãe, meus irmãos e eu – nos prepararmos para embarcar. Precisávamos chegar a Morro Redondo, uma estação perdida no campo, um pouco antes de Canguçu...

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