Estive no Forte de Copacabana dias atrás. Além da
fortificação militar, há um conjunto de bares e restaurantes e até uma filial
da Confeitaria Colombo. Fui a confeitaria para tomar café com minha
companheira, depois de andar 60 minutos (cravados no relógio) pelo calçadão de Copacabana.
Após o café, subimos até a parte externa da cúpula dos canhões para olhar a cidade
e o mar. Uma vista e tanto. Com direito a tirar fotos e divagar a respeito da
paisagem, dos canhões... e das invasões estrangeiras ao território brasileiro.
Estudante de Ginásio, fiquei fascinado pelas
histórias de piratas na região, em especial aquela comandada por Duguay-Troin,
em 1711, que ocupou a cidade por dois meses (e que li pela primeira vez num
livro do Rocha Pombo). Acho que depois desse episódio não houve outra tentativa
de invasão na baía da Guanabara e não sei qual o inimigo que os militares
brasileiros imaginaram quando instalaram quatro enormes canhões no forte, antes
da Primeira Guerra Mundial. Seja qual for, no entanto, uma obra monumental (das
maiores realizadas pela engenharia militar brasileira) e que logo se tornou
obsoleta devido ao avanço da indústria bélica proporcionada pela Guerra de
1914. (Grande Civilização Ocidental, nenhuma outra criou armas de destruição
tão eficazes como a nossa!)
Na hora (caminhando sobre a cúpula dos canhões)
disse para minha companheira que os canhões nunca dispararam contra um inimigo
estrangeiro. Nunca houve qualquer tentativa de invasão. Mas descobri depois que
os canhões foram utilizados para atingir um cruzador brasileiro na década de
1950. Um episódio estranho, mas corriqueiro na história da República brasileira,
de tentativa de golpe de estado liderado por forças conservadoras temerosas pelo
avanço de um líder progressista, e que passo a narrar a seguir (e convido o
leitor a prosseguir, caso ele tenha interesse a respeito dessas chatices da
história brasileira).
Em novembro de 1955, governava o Brasil João Café Filho,
que assumira a presidência em agosto do ano anterior, devido ao suicídio de
Getúlio Vargas. Café Filho foi conivente
com a oposição a Vargas (aquela mesma que o pressionou, pretendendo a sua
queda) e chamou vários políticos da UDN para ocupar ministérios no seu governo.
Isto, no entanto, não saciou a sede de poder dos udenistas. Contrariados pela
vitória de Juscelino Kubistchek nas eleições presidenciais (em outubro de 55),
a UDN e parte das Forças Armadas voltaram a tramar um golpe de estado. Café Filho
sentiu a pressão e caiu fora, isto é, inventou um problema de saúde e se
licenciou do cargo. (Recordo a professora Helga Piccolo abordando o episódio em
alguma palestra, ironizando o modo como Café Filho deixou a presidência e
tirando sorrisos da plateia. Uma professora inesquecível.)
Café Filho picou a mula, assumiu Carlos Luz (presidente
da Câmara), sintonizado com os golpistas e pronto para concretizar qualquer
coisa que barrasse a posse de Kubistchek (a UDN temia que JK retomasse a pauta
nacionalista de Vargas). O general Henrique Teixeira Lott (Ministro da Guerra)
percebeu a manobra e armou um contragolpe. Os setores legalistas das Forças
Armadas apoiaram Lott e Carlos Luz teve que fugir do Rio de Janeiro. Embarcou no
cruzador Tamandaré (com políticos udenistas, entre eles Carlos Lacerda, e
centenas de militares), partiu em direção ao porto de Santos (de onde pretendia
liderar o golpe) e, ao sair da baía da Guanabara, ficou na mira dos canhões do
Forte de Copacabana...
Foi nesse momento que as canhoneiras funcionaram. Talvez
seu único momento de utilização militar. Os tiros não atingiram o cruzador (que
manobrou de forma hábil para escapar dos disparos) e a história teve um final
feliz, isto é, não houve mortos na jogada. O Tamandaré chegou ao seu destino,
os golpistas foram detidos no porto de Santos pelos militares legalistas, Carlos
Luz foi deposto (mas não preso) e JK assumiu no ano seguinte.
Resumindo, os canhões do Forte de Copacabana só
funcionaram para amedrontar um golpista e seus comparsas. Talvez um episódio
emblemático da nossa história republicana, tão pródiga em golpes (e nem todos
fracassados).
Acrescento, no entanto, que meu passeio ao Forte de Copacabana não se resumiu ao um “revival” da nossa história política. Foi um passeio de turista. Momento de se sentir num cenário privilegiado, de encantamento com o mar e com o Rio de Janeiro, e de poder compartilhá-lo com uma pessoa querida. Os canhões, quatro enormes canhões (dois de 305 mm, dois de 75 mm), não passaram de detalhes.
Turistas tirando fotos na cúpula dos canhões do Forte de Copacabana. Ao fundo, os canhões de 305 mm. |
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