sexta-feira, 17 de agosto de 2012


Na porta da Reitoria

Se você é professor, funcionário, estudante ou utiliza o espaço da Universidade Federal de Santa Maria para alguma coisa, quantas vezes já foi barrado nesses últimos meses? Barrado de entrar no campus, na Reitoria ou em outro lugar da universidade, por conta das operações de choque do movimento grevista?
Da minha parte, não pude entrar na Reitoria quatro vezes, de julho para cá. Em duas ocasiões, eu não me incomodei. Numa terceira, eu soube com antecedência que os grevistas fariam a invasão e driblei o problema. Mas hoje, sexta-feira, fui surpreendido e me irritei. Cheguei até a porta da Reitoria e resolvi bater boca com os estudantes que estavam lá.
Uma menina abriu a porta e disse que “ninguém vai trabalhar hoje”. Fiquei discutindo com os guris que faziam a segurança externa e perguntei o que eles estavam ganhando com o movimento. Argumentei que a greve é um sucesso do ponto de vista político – emparedou a Dilma, engessou a UFSM, produziu dividendos políticos inegáveis para o PSOL & PSTU –, mas, e daí? Tirando isso, o que as categorias envolvidas estão ganhando? A greve já não foi além do razoável?
A conversa durou pouco tempo e praticamente apenas eu falei. Além do aviso da estudante, que abriu e fechou as portas da Reitoria para dar o seu recado, os estudantes que faziam a guarda foram lacônicos, disseram apenas duas frases, que reproduzo logo a seguir.  
“Estamos lutando contra a intransigência da Dilma”, disse um deles, quando falei que a greve passara dos limites e que não havia intenção de negociar por parte dos comandos de greve. E me estendi falando do movimento dos professores, que explicitou uma cisão profunda na categoria, com o ANDES recusando o acordo com o governo que o PROIFES aceitou. Uma atitude que terá danos irreparáveis para o ANDES, do meu ponto de vista.
Depois, com a continuidade da minha conversa, procurando responder que os estudantes não estavam na disputa por interesses político-partidários, um dos rapazes repetiu o slogan clássico: “estamos lutamos pela melhoria da educação”.
Aí não deu. “Isso é conversa pra boi dormir”, falei. E saí de cena. Com 57 anos, 34 de magistério (21 na UFSM), não posso endossar um argumento desses. Acreditar que, na conjuntura atual, com os números espantosos de crescimento da UFSM, uma greve de três meses possa sinalizar luta por melhoria educacional, puxa vida, é demais! Deixo esse argumento para os que chegaram ontem ao mundo.
Na porta da Reitoria, percebi que mudei. Mudei meu entendimento de luta política, luta econômica e por melhoria da educação. Estratégias de ocupação, com agressão à liberdade dos outros, só em casos excepcionais. Na conjuntura atual, não me parece que somem positivamente. Não sei se indicam o beco sem saída a que o movimento chegou ou, simplesmente, muito pior, a sua irresponsabilidade.

6 comentários:

  1. Esse texto é um exemplo do processo de metamorfose pelo qual os militantes petistas passam.

    Queria ver se escreveria este mesmo texto, com o mesmo teor, durante o tempo do FHC. Com certeza, os dividendos políticos seriam dirigidos ao PT (como se o apoio à luta fosse mero oportunismo).

    Vitor, das conquistas salariais, de condições de trabalho e de carreira dos docentes e dos técnico-administrativos, qual foi sem luta e prejuízo para a comunidade acadêmica? Quem sabe no dia que a educação for realmente uma prioridade, não precisemos deste triste mecanismo...

    Triste ironia, não?

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  2. No movimento dos professores, sempre houve preocupação em relação às formas de exercer a prática da greve. Em relação ao modo como criar o fato político e conquistar dividendos. Em 1987, como integrante do Centro dos Professores, participei da ocupação da Praça da Matriz em P.Alegre. Uma preocupação constante era a de não criar constrangimento para a população usuária daquela região da cidade. Pelo contrário, ganhar o apoio da população.
    Do ponto de vista político, o "dano" à população precisa ser pensado com cuidado. Passado certo limite, resulta negativo para o movimento - especialmente, na conjuntura dos últimos anos, se o movimento for de funcionário público.

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  3. Sem dúvida Biasoli. Mas diga qual greve não teve seus inimigos, até mesmo ou principalmente dentro da sua própria categoria? A palavra pelego vem sendo empregada neste sentido desde os primórdios da luta sindical! O difícil é entender que depois de uma greve como esta todos ganharão, não apenas os que deram a cara a tapa.

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  4. É bom mudar, professor Biasoli. Essa sua mudança me parece ter a estrutura da passagem de uma figura do espírito à outra, na Fenomenologia do Espírito de Hegel. Passagem que a extrema-esquerda não faz porque não consegue e não pode. Os indivíduos que passam pela extrema-esquerda podem se salvar, mas não a extrema-esquerda. Ela é uma força corrosiva e essa é sua essência. O declínio dos quadros eleitorais desse pessoal que, desde 2006, tem candidatos cada vez piores, é inversamente proporcional à qualificação de sua prática no âmbito em que ainda podem atuar: violência simbólica. Todo esse comportamento "brevista" é sintomático, patológico. O exagero e a histeria das "barrigadas" só não é risível porque tem trazido ônus para a comunidade, e isso não é engraçado.

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    1. Quem tem trazido ônus a sociedade é o Partido dos Trabalhadores, isto é que tem ficar bem claro, se há algum partido na dianteira das relações que oprimem as lutas dos trabalhadores, e responsável pelas suas condições, é o PT, não há dúvida. O PT de pouquíssimo tempo atrás, se hoje ainda na oposição, estaria tripudiando as políticas governistas e as atitudes obscuras do partido. Engana-se, seriamente, quem acha que o Psol ou Pstu hoje lideram o movimento estudantil da UFSM, e isso não é um "discursinho" furado. As greves, até onde sempre imaginei, servem para "perturbar" a ordem das coisas, mostrar à sociedade que sem aquela categoria a coisa desanda, empaca. E se numa greve de ensino, podemos ter aulas, continuam-se pesquisas, faz-se matriculas, isto nem é uma greve de verdade. As greves podem e deveriam ser mais breves, desde que uma categoria solidarizá-se com a outra, dentro de uma esfera de trabalho, ou mesmo uma profissão distante, mas que seja vital para a sociedade ou que esta em condições tão precárias que não tem capacidade de se organizarem sozinhas. Geralmente um camarada pode reclamar da greve de hoje e de ontem, porque agora goza das conquistas (migalhas) das greves anteriores, que também pode ter sido contra, apesar de que naquela época ser contra greve cheirava meio burguês.

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  5. É dar uma olhada na história e veremos que nos conflitos ambos os lados têm indivíduos em vários níveis de entendimento do processo. Assim cada conflito de interesses é diferente. Não existe outro igual, semelhante até por ali. Mas é uma ferramenta utilizada antes de adotar medidas extremas. Impedir a entrada em hospitais é intolerável, mas o que tem na reitoria de tão imprescindível. Se ela, a greve, é legal ou justa, só o tempo dirá. Querer que os estudantes sejam todos inteligentes ou todos os professores competentes, governantes sábios e imprensa imparcial, somente em outro mundo. O PT usou e abusou das greves, está apenas provando o próprio sistema, que difundiu e se orgulhou em tê-lo como meio para suas revindicações.

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