Caminho pela Rua Floriano Peixoto e escuto a frase:
– A mamãe não quer que tu ponhas porcaria na boca.
Olho para a “mamãe”, vejo uma senhora puxar um
cachorrinho pela coleira – o cusco estava furungando alguma coisa na calçada –
e constato com quem ela está falando. Então lembro uma conversa de estudantes
de Veterinária: a rapaziada não agüenta os “papais” e as “mamães” que chegam as
clínicas. Que essa é uma das pedreiras da profissão. A gurizada tem que se
preparar.
– É precioso ter psicologia – dizia um dos estudantes.
– Agora o veterinário tem que ter preparo semelhante ao do pediatra.
Observo a “mamãe” do cusquinho passar por mim e penso
que o guri está com razão. Essa aí deve chegar a clínica e explicar que o seu “filho”
não obedece ou coisa assim:
– O que eu faço, doutor?
Conto isso a um amigo que se apaixonou pelo poodle da
filha e ele comenta que não entendo nada da relação entre homens e animais.
Não entendo mesmo. Sou do tempo em que cachorro era cachorro
– bicho, animal doméstico – que se tratava com carinho, sim, mas não passava do
umbral da porta da cozinha. Vivia e dormia no pátio.
Um dia, meu irmão mais velho chegou com um filhote de
perdigueiro com vira-lata e foi uma festa lá em casa. Foi o único
cachorro da minha infância. Nós morávamos em casa e meu irmão criava pombas e periquitos. Os periquitos tinham um viveiro; as pombas,
uma casinha que ficava perto do chão. Uma tentação para o cusquinho! Banzé era
o nome dele. Passaram-se alguns dias e o Banzé entrou na casinha das pombas e saiu
com uma delas na boca.
Não vi o cachorrinho mastigando a pomba. Vi ele correr
feliz da vida pelo pátio, com umas penas no canto da boca. Custei a entender. Meu irmão logo compreendeu a situação e ficou furioso. Uma lição para nós. Jamais imagináramos que o Banzé
fizesse uma coisa daquelas.
– Ele é bicho – o pai explicou – ele não fez nada
demais – e ajudou meu irmão a colocar a casa das pombas numa altura que o Banzé
não alcançasse.
Acho que é por isso que tenho dificuldade em entender
esses cachorrinhos que viraram gente. Que se tornaram “filhos” e passaram a ter
mamães-gente, papais-gente, e até vovós.
– Haja psicologia! – disse um estudante de Veterinária
Muito boa crônica. Eu tenho carinho por cães e gatos. Agora, tem uns donos de cachorros que são duros de aguentar.
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