No domingo de Páscoa fiz uma visita guiada a
Vinícola Campestre, em Vacaria, e fiquei admirado com a beleza do local. Andei pelos
parreirais, pelos espaços da produção, pela adega, finalizando com uma
degustação de seus vinhos finos, muito bons. Mas fui informado que o
carro-chefe da empresa são os vinhos de mesa, mais populares, com uma produção
de garrafas muito superior ao dos vinhos de qualidade que bebi.
A vinícola também oferece um sofisticado salão para
festas (300 pessoas sentadas) e muitos casamentos são comemorados ali. Por
exigência das noivas foi construída uma capela, com uma pequena torre e um sino.
Sino este que a guia liberou para quem quisesse tocar e eu me escalei para dar
umas badaladas.
Quando tinha 10 e 11 anos de idade fui coroinha na
Igreja do Porto, em Pelotas, e recordei isso ao tocar o sino. Nós, os
coroinhas, subíamos até o coro da igreja, onde estavam as cordas dos sinos, e
lá nos dependurávamos (literalmente) nas cordas para fazê-los soar, sem grande
preocupação de ritmo. Tocávamos chamando os fiéis para a missa de domingo de
manhã e nunca ouvi o padre reclamar da falta de precisão das badaladas. Às
vezes um sacristão mais experiente dizia como a coisa devia ser feita – o modo
correto, controlando o badalo para dar um ritmo mais rápido ou mais lento – e
nós, os pequenos, procurávamos aprender.
Na visitação à vinícola tentei controlar o badalo,
mas não obtive bom resultado. Seja como for, voltei a ser um guri... como era na
Igreja do Porto, em Pelotas.
As igrejas foram parte importante da minha infância
& juventude e reviver isso não é ruim. Fui coroinha na infância, integrante
de grupo de jovens entre os 15 e 17 anos, e durante anos não perdi missa de
domingo.
Meses atrás estive em Pelotas, fui passear na Zona
do Porto e de repente me vi dentro da igreja onde fui coroinha, assistindo a uma
missa. Não fui até o final (atualmente sinto cansaço enorme com as cerimônias
religiosas), mas devo dizer que me emocionei.
Quando saí da igreja, senti como se um manto de
tecido grosseiro fosse colocado sobre meus ombros, o manto “da minha culpa,
minha máxima culpa”, e me senti rezando o Ato de Contrição, pedindo perdão por
não sei quais pecados... Caminhei meia dúzia de quadras revivendo antigos tormentos
e sentindo que eles ainda são capazes de pesar dentro de mim. Ao final, após alguma
ginástica mental, me livrei daquele manto, daquela lembrança opressiva, e
respirei aliviado.
Tocar os sinos da Igreja do Porto, aos domingos,
podia ser divertido, mas viver aquele mundo católico não era fácil. Era o meu
mundo, no entanto.
Ao ensaiar as badaladas na capela da Vinícola
Campestre, porém, não revivi nenhuma angústia. Nem manto grosseiro nem tormento
algum me alfinetando. Segui a visita prestando atenção a guia, compartilhando
pequenos comentários com minha companheira, com meus colegas de excursão e, na
hora da degustação, apreciei cada gole dos vinhos oferecidos.
Mas reconheço: o mundo católico está dentro de mim.
Nem precisa cavar muito. Volto e meia a coisa vem à tona e estou dialogando com
elementos desse universo religioso. Com uma história de santo, um quadro
religioso ou com alguma lenda de milagre ou aparição. E, como num poema de Alphonsus
de Guimaraens, volta e meia escuto um sino gemer em “lúgubres responsos” ou
algum outro “dobrar num torreão” abandonado.
Momento da visitação: a guia oferece uma taça de sauvignon blanc tirada diretamente da pipa. |
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