Comprei pãozinhos na igreja de Santo Antônio, na igreja
construída no local onde nasceu o santo, no bairro Alfama, em Lisboa. Fiz
menção de comer o pãozinho na hora e fui avisado que tomasse cuidado. “Uma
senhora quebrou a chapa”, falou o homem que vendia os pãezinhos. Um sujeito
divertido. Na frente da porta da igreja, de pé ao lado de uma grande mesa, cheia de pães e objetos de
devoção, o homem explicava o que era preciso fazer. Ele ensacava os pães,
recolhia o dinheiro, e não deixava de falar na devoção, nas crenças e ritos que
envolvem o santo.
Não podia comprar um só, ele explicava. Precisava
levar no mínimo dois. Um eu podia comer no dia, mas molhando no leite ou na
sopa. “Cuidado, os pãezinhos são duros.” O homem falava e ria. O outro era para
guardar em casa e comer um ano depois (sim, um ano depois), fazendo uma oração,
um pedido. "A coisa não falha." O homem ria um riso bom de devoto, de quem
sabe misturar as coisas do mundo profano com as do sagrado e fazer disso um
poema de religiosidade.
Eu estava zonzo e não entendia direito o que se
passava. Lembrava da minha avó, da minha infância... Estava em Lisboa e em Pelotas. Quando
era criança, via a vó chegar da igreja com uns pãezinhos dentro da bolsa e os distribuir dizendo que tinham sido abençoados. Era dia de Santo Antônio. Meus irmãos e eu comíamos sem receio algum
de quebrar um dente e acreditávamos que alguma coisa boa pudesse acontecer. Eu
acreditava. Então comia devagarinho - e só o que lembro é que eram muito macios aqueles pãezinhos.
De alguma maneira, era isso que queria repetir ali, na
igreja de Santo Antônio, no lugar onde nasceu o santo. Repetir uma experiência de infância. Mas fiquei na vontade.
Tive medo de quebrar um dente e guardei os dois pãezinhos na mochila. Depois,
no hotel, acomodei-os na mala e ainda pouco rearranjei-os entre as roupas e
presentes, preparando a bagagem para voltar ao Brasil.
Com cuidado, estou levando os pãezinhos para casa,
para comê-los na mesa da cozinha, junto com meu filho. Imagino que vamos
molhá-los numa sopa, que abrirei um vinho tinto e, da minha parte, a única
oração será a lembrança da infância e daquele jeito infantil
de acreditar nas coisas. E será um milagre se a esperança experimentada naqueles "verdes anos" vier me visitar novamente. Se acontecer, direi que é coisa do santo. Que ele não falha. Coisas do Sant'Antoninho.
Nenhum comentário:
Postar um comentário