Foi lançado na Assembleia Legislativa, em Porto
Alegre, um livro em homenagem ao Irmão Antônio Cecchin, uma personalidade que é
referência para os movimentos sociais no Brasil e, em especial, no Rio Grande
do Sul. Sua prática política-religiosa esteve vinculada à criação da Comissão
Pastoral da Terra, do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra
(MST), da Romaria da Terra e da Pastoral da Ecologia. É de sua autoria também o
processo de canonização do índio guarani Sepé Tiaraju.
Irmão
Antônio nasceu em Santa Maria, em 1927, e tornou-se religioso Marista em 1946.
Em novembro do ano passado, faleceu. Lecionou no Colégio Rosário, em Porto
Alegre, foi membro da Ação Católica e talvez essas duas atividades – a de
professor de escola confessional e a de católico engajado – sejam as
definidoras da sua vida.
Nos anos 1950, alinhado à orientação
de D. Helder Câmara, participou da transformação da Ação Católica, a qual
adotou o método “Ver, Julgar e Agir”, uma mudança ideológica que correspondia
aos novos ventos que agitavam a Igreja Católica, conduzindo-a ao Concílio
Vaticano II, à Conferência de Medelin e à “opção preferencial pelos pobres”.
Enquanto
professor nas escolas maristas (entre o final da década de 1940 até o início
dos anos 70), Irmão Antônio criou as Fichas Catequéticas (material para a
formação religiosa de adolescentes), as quais considerou um “divisor de águas”
na sua vida. As Fichas se tornaram alvo de grande polêmica no Brasil e foram
condenadas pelo Ministro da Educação Jarbas Passarinho, em 1970, durante o Governo
Médici. A partir daí (e também devido às prisões que sofreu, em 1969 e 1972)
sua prática religiosa passou a se dar junto às populações desfavorecidas e não
mais entre os jovens de classe média e alta atendidos pelas escolas maristas. É
a partir daí que sua prática religiosa se vincula aos setores sociais
marginalizados do campo e da cidade, como os agricultores sem terra, os
migrantes nas periferias urbanas e os catadores de lixo, e à criação de
organizações capazes de levar a cabo suas demandas.
Irmão Antônio realizou uma ação
política sempre vinculada à fé católica, voltada à “conscientização libertadora
dos excluídos” (nos termos estabelecidos pelas Comunidades Eclesiais de Base),
e capaz de articular-se com outras religiosidades, como as de matriz indígena e
africana.
Quem acompanhou o seu trabalho sabe
dessa capacidade de aglutinação das diferentes religiosidades em torno de uma
proposta teológica católica. O título do livro – “Irmão Antônio Cecchin: ‘seguindo
o caminho’ (At 9,2) em busca da Terra Sem Males” – é indicativo disso. Reúne –
a partir do seu nome, o nome de um militante religioso – a fusão entre uma
passagem bíblica (do Atos dos Apóstolos, “seguindo o caminho”) com o cerne da
crença religiosa guarani (a busca da Terra Sem Males). Em resumo, a articulação
da religiosidade do colonizador católico com a religiosidade de uma das populações
mais antigas da sociedade sul-rio-grandense. Uma fusão religiosa visando a
melhoria das condições de vida das populações mais carentes e que deu resultado.
Afinal, estão aí os assentamentos de pequenos agricultores realizados pelo MST
(movimento social que ajudou a criar) e também a organização de vilas populares
em Canoas (das quais foi liderança fundamental).
Trata-se de um livro, organizado por Matilde Cecchin, feito de depoimentos que lembram e celebram a dimensão grandiosa e também de humildade desse excepcional militante político-religioso. Um livro que também aponta um realidade social - a dos excluídos de muitos dos benefícios proporcionados pela nossa sociedade - que está longe de ser equacionada de forma civilizada.
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