Uma das boas surpresas dessa última Feira do Livro, em Porto Alegre , foi o lançamento
do livro Esquina Maldita, de Paulo
César Teixeira (Editora Libretos, 210 p.). Uma investigação jornalística a
respeito dos bares que existiram na esquina da Rua Sarmento Leite com a Avenida
Osvaldo Aranha, entre as décadas de 1960 e 1980: Alaska, Estudantil, Copa 70 e
Marius.
O Bar Alaska, pioneiro, foi criado em 1965, e na
seqüência surgiram os outros três. Os cursos da UFRGS funcionavam nas
imediações e esses bares passaram a reunir a juventude universitária. A
Esquina foi o point da esquerda estudantil e, ao longo dos 70, agregou também
uma outra juventude, nem tão engajada politicamente, isto é, nem tão inserida
nos partidos políticos (ou organizações clandestinas) e mais adepta das
políticas do corpo, das drogas, das práticas alternativas e coisas assim.
O autor entrevistou os donos dos bares, historiou cada
um dos estabelecimentos e também procurou os seus frequentadores mais ilustres:
a Nega Lu, a Lucrécia, o casal Chico Daniel e Bete Portugal, entre eles. Talvez
as figuras mais emblemáticas do que se considerava ousadia nos anos 70: a
postura homossexual assumida, no caso da Nega Lu e Lucrécia; o casamento
aberto, no caso de Chico e Bete.
Significativamente, o livro é dedicado a duas figuras emblemáticas
da Esquina: Isake Plentis, o garçom do Alaska, e Joãozinho (João Alberto
Figueiró), estudante de Ciências Sociais (depois professor), um freqüentador
assíduo. Ambos morreram há pouco tempo e não seria exagero dizer que simbolizam
a fauna do lugar: Isake, um trabalhador, garçom atencioso, e Joãozinho, o
boêmio solitário, bom de copo e ótimo papo.
Como bem afirma o autor, a droga mais utilizada na
Esquina era o álcool, mas as outras drogas (ilegais) também circulavam.
Maconha, seguramente, a mais utilizada, mas que não era fumada no interior dos bares, só na
rua. Havia uma turma que usava drogas injetáveis, mas eram poucos, muito
poucos, e se picavam nas imediações. Uma turma que arrancou do escritor Caio
Abreu um comentário exagerado: “Isso aqui parece Amsterdam”. Exagerado porque, na
maioria, os frequentadores eram apenas adeptos do álcool e grandes
conversadores. Não havia música nos bares – tirando as apresentações eventuais
da Nega Lu, no Estudantil – e se conversava muito, muitíssimo, assim como se namorava
também.
Quanto ao quesito namoro e sexo, muito boa a
investigação do autor a respeito dos recintos reservados do Estudantil. Diz a
lenda que ali rolava sexo entre os casais, mas o autor não encontrou comprovação.
Pura lenda. Apenas amassos, abraços e beijos, e mãos e pernas pra lá e pra cá.
Paulo César Teixeira, autor do livro, faz uma boa
história da Esquina e das diferentes gerações que perambularam pelos bares. A
turma mais militante dos anos 60 e início dos 70, e a turma mais voltada às práticas
alternativas, no final dos 70 e início dos 80. Segundo o autor, “um gueto de
boemia com vida intelectual inquieta e independente, cujos protagonistas foram
testemunhas e artífices do surgimento de uma cultura urbana contemporânea.” “Muitas
idéias que circulavam nas conversas se transformaram em realidade nos anos 2000” , conclui o autor.
Uma avaliação serena e otimista das tantas conversas & delírios que rolaram
naqueles bares. Aquele antro de "proselitismo e porra-louquice" abrigou projetos e ousadias - no campo das artes, da cultura e do comportamento - que hoje estão consolidados na vida porto-alegrense. Segundo um dos entrevistados, por ali passou uma revolução e a coisa até deu certo. Pode crer.
Vitor. Andando por POA recentemente, tive a impressão que o "Bom Fim" e seu clima mudou-se para a cidade baixa- em particular aqueles quarteirões entre a Lima e Silva, José do Patrocínio e João Alfredo e suas travessas da Venâncio a Perimetral perto da Faculdade de Medicina.
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