domingo, 13 de novembro de 2011

O exercício da crônica

Diz uma das regras da crônica que este gênero literário é marcado pela narrativa na primeira pessoa, expressando uma visão pessoal a respeito das coisas, do mundo, da vida. Entendo, então, que um dos riscos que o cronista corre, ao seguir essa norma, é não sair do entorno do próprio umbigo. É o de fechar a narrativa na própria experiência, não alargar o sentido das mesmas, e não permitir que o leitor possa se encontrar dentro dela e fazer pontes, relações, associações com a sua própria trajetória.
Desta maneira, entendo que outra regra essencial do gênero é justamente saber usar as experiências pessoais, a visão subjetiva e as próprias idiossincrasias para permitir um diálogo com o leitor. E esta, me parece, é a grande aventura da crônica. Pretensiosamente, diria que esta é a aventura a que me proponho: a de que o texto que escrevo consiga ir além do próprio umbigo. Uma narrativa em primeira pessoa, sim, mas que possibilite uma leitura que vá além do que está referido.
O cronista, por exemplo, aborda o seu nascimento numa cidade do interior do Rio Grande do Sul, comenta as leituras do verão, uma cerimônia de formatura e espera que tudo isto ganhe um sentido maior do que está sendo explicitamente narrado. Afinal o seu nascimento bem pode ser como o nascimento de outros tantos; as leituras, as de muitos leitores; e as formaturas, aquelas que muitos de nós assistimos.
Este é o projeto do literato. Que pretensão!, dirá o leitor. Mas eu acrescento: é o projeto do poeta. Do sujeito que se constrói a partir da poesia e que entende que é da poesia que tudo irradia. Do sujeito que entende que é preciso estar atento ao ritmo da vida e da linguagem. Atento e distraído. Desperto para perceber o sumo da laranja que escorre nas mãos, quando descasca a fruta. Perceber que o sumo vai além do sumo e que pode ser, conforme o vento que sopra, o sangue das árvores ou passagem para alguma lembrança. Perceber, na atividade sexual, o movimento dos astros e talvez de um cometa cruzando repentinamente a penumbra do quarto no instante do orgasmo. Perceber a vida, a fragilidade da vida, e a face escura (às vezes bisonha) da morte.

2 comentários:

  1. sim, não é a mesma visão de todo mundo. e claro que é pretensão. mas sem pretensão não se faz arte nenhuma. só se deixa o tempo passar em branco. parabéns pelo blog. foi uma ótima ideia (sei que foi mais que uma ideia, foi uma necessidade).

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  2. Gostei desta pequena introdução à crônica. Já te disse que li teu último livro. Como te falei no email, gostei também. Seria interessante olhares para todos os lugares, em que estiveres.
    Terminei o livro da Cláudia Tajes "Sou louca por homem". Pequenas estórias de amores diferentes, mas gostei da tipologia dos homens que ela desenvolve no livro. Coisa boa para um (a) cronista do gênero macho. Vide o David Coimbra sobre as mulheres, homens e o futebol.

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