quarta-feira, 31 de agosto de 2022

Oftpred - colírio

           Oftpred é o colírio que me acompanha nos últimos tempos. Um colírio para uso específico: inflamação na íris. Já usei Maxidex, Predfort; agora é este. Tive a primeira inflamação nos olhos em 1977, com 21 anos, e deste então sou um usuário constante desse tipo de medicamento. Afinal tenho essa doença todos os anos, às vezes mais de uma vez – mas felizmente (na maioria das vezes) debelada apenas com colírio.

Já escrevi um poema tematizando as inflamações nos olhos, mas nunca consegui enfocar o colírio, como fez João Cabral Melo Neto com a aspirina. Em 1966, em Educação pela pedra, o poeta publicou “Num monumento a aspirina” e comparou o remédio com “o mais prático dos sóis”, “sol imune às leis da meteorologia”, pois “a toda hora em que se necessita dele, levanta e vem (...) para secar a aniagem da alma.”

Na segunda estrofe do poema, o poeta faz uma analogia da aspirina com a lente, mas com a peculiaridade de ser “de uso interno”, de funcionar “por detrás da retina” e ser capaz de reenfocar “para o corpo inteiro (...) o borroso de ao redor.”

Sempre gostei desse sol cabralino que lava a dureza da alma e dissolve o borroso ao redor. Utilizando as mesmas imagens para o colírio, diria que suas águas de cor leitosa, que podemos dispor a qualquer hora, afogam a dor e desanuviam a visão. A dor e visão nublada que irrompem nos olhos inflamados. desenhando uma coroa vermelha em torno da íris. Pequeno tormento da minha vida inteira a apontar as fragilidades do corpo.

Mas sofrimento capaz de ser contornado e combatido. Quando tive a primeira vez, o oculista (Rivadávia Corrêa Meyer) chegou a pensar que eu ficaria com a visão prejudicada. Recordo que fui atendido de emergência (por insistência da mãe), o médico pingou um colírio para dilatar a pupila, outro para combater a uveíte (outro nome para a inflamação na íris) e me mandou para casa. Voltei horas depois, ele me viu no corredor de espera e veio me examinar. Observou o olho doente, sorriu e disse:

– Reagiu.

Depois, no consultório, me examinando com uma daquelas máquinas de ver o fundo do olho, contou a sua preocupação, isto é, que tivera receio da inflamação (que era extremamente forte e demorara para ser medicada) me deixasse com sequelas irreversíveis: uma visão anuviada e a dificuldade de discernir as cores.

           Lembro de que falei do meu interesse em pintura e ele sorriu novamente. Também respirei aliviado, mas nunca fiz um poema para os colírios Maxidex, Predfort, Oftpred (entre outros), fundamentais para combater essa teia conflituosa que tantas vezes apunhala meus olhos e me deixa com a visão turva e borrosa.

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