sábado, 30 de novembro de 2019

Galerias Lafayette


Fazem parte do roteiro turístico lugares que não são para o nosso bico. No Rio de Janeiro, certa vez, entrei no Copacabana Palace, me instalei numa das mesas do pergolado da piscina, tomei um cálice de vinho branco e me senti uma espécie de penetra. Mas só entrei por conta da insistência da minha companheira.

Fomos atendidos por um rapaz argentino que tinha curso de graduação em Arqueologia e acho que ele sacou que não pertencíamos àquele território. Nem por isso deixou de nos tratar bem e até disse que o vinho que eu pedira era uma boa escolha.

Então é esse o mundo dos bacanas?, pensei, lembrando a leitura de “Os Guinle: a história de uma dinastia”, um belo trabalho historiográfico a respeito dessa família que se expandiu a partir da exploração do porto de Santos, concessão adquirida no final do século XIX. Um dos rebentos da família resolveu investir na hotelaria de luxo e o resto faz parte do folclore glamuroso do Rio. Hoje o hotel não pertence mais aos Guinle, mas os novos donos mantem o charme do local.

Conto essa história porque na recente viagem a Paris também me aventurei num território que não é o meu: fui visitar as Galerias Lafayette, o templo da moda parisiense. Fui por insistência da Rose, minha companheira, claro, e acabei gostando. Nem sabia que as tais galerias existiam, pois, afinal, o que sei de produtos da Dior, Louis Vuitton, Saint Laurent e coisas do gênero?

Mesmo assim, com toda a minha ignorância a respeito do mundo da moda e do luxo, uma visita que valeu a pena. Vencido algum constrangimento, achei divertido flanar pelos corredores repletos de grifes famosas, olhar os preços e também as filas diante das lojas, filas de 10 a 15 pessoas, a maioria mulheres – algumas delas milionárias chinesas, essas figuras peculiares criadas pelo socialismo de mercado chinês.

E, diferente do que vivi no Copacabana Palace, não me senti um penetra. Provavelmente porque ali os simples visitantes (isto é, aqueles que não são consumidores potenciais) estão previstos na dinâmica da casa. Para visitar a famosa cúpula (ver fotos abaixo) há uma plataforma que avança pelo espaço, um local para a fila, um funcionário administrando os visitantes e batendo palmas quando termina o tempo da visita. Talvez o mesmo período de tempo permitido pelos guardas do Louvre aos visitantes da “Mona Lisa”. Deleite-se, mas com tempo marcado.

Seja como for, um espetáculo que enche os olhos, não custa nada nem se paga ingresso, como escreveu uma jornalista de turismo que leio regularmente.

Espaço interno da cúpula das galerias, com a plataforma para visitantes.

A plataforma com os visitantes extasiados.
Na primeira vez que fui às Galerias, fiz o roteiro de praxe (entrar no plataforma, tirar fotos) e depois sentei num café no entorno para apreciar melhor a cúpula secular e a infinidade de “lojinhas”, o território pujante do consumo de luxo. Não houve jeito de não lembrar de um filósofo contemporâneo se referindo ao capitalismo como um extraordinário sistema de produção de riquezas – mas também de misérias. No caso, porém, eu estava apenas diante das riquezas. Um grande espetáculo, a Paris dos cartões postais, da moda e do esplendor (como nos tempos do Rei Sol, exagerando).
Observando atentamente o local, minha companheira comentou que nunca vira tanta gente vestida de grife por metro quadrado. E não qualquer grife, mas as mais caras. Achei a observação ótima, talvez a síntese das Galerias ou, ao menos, dos seus personagens principais, os consumidores potenciais. Um território fascinante, distante do bolso da maioria dos turistas, mas nem por isso descartável num roteiro parisiense. Quem sabe o tipo de local que muitos de nós procuram quando viajam ao exterior. O território das fotos deslumbrantes das revistas, das reportagens de TV, que nós vemos sentados no sofá da sala de casa e nos perguntamos: será que existe? 

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