Não é pouca coisa o que propõe o
professor e filósofo Ronai Rocha no seu livro “Quando ninguém educa:
questionando Paulo Freire” (Editora Contexto, 2017, 153 p.): um diagnóstico da
educação brasileira, um mapeamento do cenário conceitual que marca a atual
discussão a respeito dos planos curriculares (a polêmica BNCC), e uma defesa do
reerguimento da escola e da mística do professor. Tanto um texto de combate,
que fustiga a pedagogia brasileira (em especial a de matriz freireana), quanto de
reflexão ponderada e até poética a favor da melhoria da escola, do
revigoramento da atividade do professor e do engajamento do aluno. Ora é a voz
do filósofo que domina o texto, esmiuçando os conceitos que orientam o debate
educacional, ora é a do professor que vive a realidade escolar desde os anos 70
e tem o doloroso entendimento de que a escola foi rebaixada e não está
cumprindo à contento as suas funções de ensinar os conhecimentos básicos.
Na avaliação do autor, esse
rebaixamento da escola aconteceu devido a “um certo extravio de nossa cultura curricular e pedagógica", ocorrida a partir da virada da educação brasileira nos anos 70 e 80. Uma transformação explicável a partir da expansão da rede de ensino e das decorrentes discussões pedagógicas que a acompanharam, em especial uma maior atenção aos aspectos social e político da educação em detrimento das práticas pedagógicas propriamente ditas.
Quanto a esse estado da pedagogia, a obra de Paulo Freire, Pedagogia do oprimido, foi e é fundamental. Ronai Rocha não desconsidera o seu valor e papel históricos, mas vê como exagerada a sua influência no pensamento educacional brasileiro e compreende que a mesma se mantem “ao preço de uma leitura anacrônica”. Uma leitura descontextualizada, que minimiza o foco da obra, a alfabetização de adultos, assim como a problematização das opressões em geral e do diálogo com as camadas populares nos termos das décadas de 60 e 70. Temas candentes, claro, mas que o autor entende não serem os centrais para a construção de um modelo escolar formal.
Quanto a esse estado da pedagogia, a obra de Paulo Freire, Pedagogia do oprimido, foi e é fundamental. Ronai Rocha não desconsidera o seu valor e papel históricos, mas vê como exagerada a sua influência no pensamento educacional brasileiro e compreende que a mesma se mantem “ao preço de uma leitura anacrônica”. Uma leitura descontextualizada, que minimiza o foco da obra, a alfabetização de adultos, assim como a problematização das opressões em geral e do diálogo com as camadas populares nos termos das décadas de 60 e 70. Temas candentes, claro, mas que o autor entende não serem os centrais para a construção de um modelo escolar formal.
O capítulo sobre a Pedagogia do oprimido já
vale o livro, mas esse não é foco principal da reflexão de Ronai Rocha. Seus
propósitos centrais são o já referido rebaixamento da escola assim como proposições de como encarar esse problema. Se a inspiração freireana foi fundamental para a
pedagogia brasileira e proporcionou ganhos consideráveis (como maior
consciência política a respeito da educação), os custos foram muito maiores,
segundo o autor. A instituição escolar foi abalada quanto ao seu papel de
transmissora de conhecimentos consagrados (a famosa e pertinente discussão a
respeito dos “aparelhos ideológicos do Estado”) e perdeu-se o sentido grandioso
da escola: o de possibilitar uma espécie de segundo nascimento dos indivíduos, aquele
proporcionado pelo conhecimento e usufruto do “legado que transcende as paredes
que nos cercam”, das Artes e da Ciência, por exemplo, construídas pela nossa
civilização.
Não é pouco coisa o que se propõe
Ronai Rocha. Não sei como os teóricos da educação de orientação freireana e
desconstrutivista reagirão à provocação, mas entendo que o questionamento
apresentado é pertinente. E, em especial, o diagnóstico da escola quanto as suas falhas no ensino dos conhecimentos básicos calará fundo os professores habituados ao chão da sala de aula. A partir daí, entendo
que até aqueles que ainda amam Paulo Freire lerão esse livro como uma provocação
instigante. Um livro que se propõe a reorganizar os termos da discussão
educacional, priorizando a revalorização do currículo e da prática pedagógica,
assim como apontando as disposições necessárias para a retomada da escola das
suas funções essenciais. Aparentemente uma proposta conservadora – a de
recolocar a escola como capaz de organizar e transmitir o grande legado da nossa
civilização (a tão mal falada Civilização Ocidental). Mas, como o autor indica,
até para que prosperem propostas revolucionárias de educação e sociedade é
necessário que a escola funcione, que o professor ensine e que os alunos conheçam
e saibam usufruir aquilo que está muito distante de suas experiências
cotidianas, como o Teorema de Pitágoras, a obra de Machado de Assis e as Bachianas de
Villa Lobos.
É ótimo que alguém critique a ideologia padrão que reina inconteste nos ambientes pedagógicos brasileiros. Saúdo o livro de Ronai Rocha e cumprimento o autor pela coragem de remar contra tão forte maré.
ResponderExcluirNa educação a filosofia faz um questionamento que é muito forte, tem muitas respostas, mas que se resume em uma só pergunta, que é?
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