O romance Cleo e
Daniel, de Roberto Freire, foi reeditado este ano pela L&PM. Lançado pela
primeira vez em 1965, tornou-se sucesso de público, principalmente entre os leitores
jovens.
Em 65, segundo a apresentação de Ignácio Loyola Brandão,
Cleo e Daniel surgiu como “um livro
diferente, claro, aberto”, capaz de mudar a literatura e a visão das coisas. A
expressão daqueles “confusos anos 60” .
Nos 70, o livro continuava agradando. Comprei uma edição em banca de revista,
em forma de jornal (coleção Jornalivro) e li mais de uma vez. Emprestei para
vários amigos e sempre agradou. Reli dias atrás e não gostei mais.
Um romance de grande vigor, com um narrador forte,
apaixonado e desesperado: o psicanalista Rudolf Flügel a perambular pelas ruas
de São Paulo e vivenciar o sexo, a loucura & o amor, e teorizar a respeito
também. Um dos personagens apresenta o mito grego do andrógino – “Nem homem,
nem mulher, os dois num só... como a gente, na cama, trepando” – e afirma: “O
filho da puta do Platão estava certo!”
De certa forma, os personagens centrais têm a
nostalgia da fusão mitológica entre homem e mulher – “Uma bola de carne sem
feições, quatro pernas, quatro braços” – que assustou os deuses do Olimpo.
Tanto assustou que Júpiter cortou essa bola de carne ao meio e deu origem ao
macho e à fêmea. E os dois, a partir de então, ficaram fadados a se procurar
eternamente...
Uma angústia que não atinge o formingueiro paulistano,
segundo o narrador. Isto é, os homens e as mulheres de São Paulo, preocupados
em trabalhar, vencer na vida e viver o amor de forma razoável. Alguns, até
capazes de apostar na religião católica ou no socialismo para reformar a
sociedade.
No meio do turbilhão de inquietações que acometem o personagem-narrador, ele se depara com um casal de
adolescentes desajustados, as figuras que dão título ao livro – Cleo e Daniel –
e a narrativa chega ao clímax. O jovem casal realiza o amor completo anunciado
pelo mito e ninguém os suporta – nem mesmo Rudolf Flügel, que
primeiramente se encantou com os adolescentes e os defendeu inclusive. Cleo e
Daniel transam nos jardins do Arcebispado e deixam o bispo perplexo, se beijam
em público, assustam a multidão e provocam a intervenção policial.
Uma fantasia romântica e desesperada: a concretização da
mitológica fusão entre homem e mulher e, ao mesmo tempo, a sua impossibilidade.
Reli o romance e não gostei. Mas já foi um livro
importante para mim. Agora, me pareceu uma narrativa desconjuntada e até confusa.
Adolescente demais, concluí. Devo ter envelhecido.
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