sábado, 9 de junho de 2012


Woodstock & Garopaba

         Cursei o clássico no Colégio Júlio de Castilhos, em Porto Alegre, no início dos anos 70. A escola funcionava (continua funcionando) num prédio de três andares, com sacadas enormes. E ali, naquelas sacadas, minha turma e eu passávamos horas conversando, tentando entender o mundo e lapidando nossos sonhos para o futuro.
Falávamos de música e literatura. O rock, os hippies e o Festival de Woodstock eram temas recorrentes. Sidarta e Limite branco, de Hermann Hesse e Caio Abreu, passavam de mão em mão e eram nossas chaves de leitura para decifrarmos o mundo.
Política, no entanto, estava fora de cogitação. O Grêmio Estudantil fora fechado, vigorava uma censura rigorosa nos meios de comunicação e sabíamos mais sobre os festivais de rock nos Estados Unidos do que da UNE e do movimento estudantil. Queríamos ser livres como os hippies norte-americanos e desconhecíamos os estudantes brasileiros que “enfrentavam a ditadura”. Às vezes alguém se manifestava “contra o sistema”, dizia ser “contra os preconceitos” e assim tocávamos o barco.
         Foi numa dessas conversas nas sacadas do Julinho que conheci uma moça tímida, que anos mais tarde veio ser minha namorada. Ela foi procurar uma amiga, minha colega de aula, e ficou por ali. Terminamos conversando, nos encontrando nos corredores da escola, mas a coisa não prosperou entre nós.
Poucos anos depois, nos reencontramos na Universidade e, aí sim, viemos a namorar. E, como bons porto-alegrenses, no primeiro verão que apareceu, pegamos as mochilas e nos tocamos pra Garopaba. Montamos a barraca na encosta do morro e ficamos namorando diante do mar. Um dia, inventei de tomarmos banho nus numa prainha do outro lado do morro, onde não havia viva alma. Imaginei que teria meu Woodstock particular – as fotos do festival sempre destacavam os momentos de nudez, liberdade e descontração –, mas ela não quis.
Era uma moça recatada e nunca quis “enfrentar o sistema” nem tomar atitudes escandalosas. Woodstock não estava no seu horizonte de fantasias, imagino. Nudez, só dentro do quarto ou da barraca. E lá fui eu tomar banho sozinho – cumprindo a sina dos adolescentes que um dia conversaram nas sacadas do Julinho e sonharam ser “livre, leve e solto”, como dizia uma canção daquela época.

Nenhum comentário:

Postar um comentário