Cursei o clássico no Colégio Júlio de
Castilhos, em Porto
Alegre , no início dos anos 70. A escola funcionava
(continua funcionando) num prédio de três andares, com sacadas enormes. E ali,
naquelas sacadas, minha turma e eu passávamos horas conversando, tentando
entender o mundo e lapidando nossos sonhos para o futuro.
Falávamos de música e literatura. O rock, os hippies e
o Festival de Woodstock eram temas recorrentes. Sidarta e Limite branco, de
Hermann Hesse e Caio Abreu, passavam de mão em mão e eram nossas chaves de
leitura para decifrarmos o mundo.
Política, no entanto, estava fora de cogitação. O
Grêmio Estudantil fora fechado, vigorava uma censura rigorosa nos meios de
comunicação e sabíamos mais sobre os festivais de rock nos Estados Unidos do
que da UNE e do movimento estudantil. Queríamos ser livres como os hippies
norte-americanos e desconhecíamos os estudantes brasileiros que “enfrentavam a
ditadura”. Às vezes alguém se manifestava “contra o sistema”, dizia ser “contra
os preconceitos” e assim tocávamos o barco.
Foi numa dessas conversas nas sacadas
do Julinho que conheci uma moça tímida,
que anos mais tarde veio ser minha namorada. Ela foi procurar uma amiga, minha
colega de aula, e ficou por ali. Terminamos conversando, nos encontrando nos
corredores da escola, mas a coisa não prosperou entre nós.
Poucos anos depois, nos reencontramos na Universidade
e, aí sim, viemos a namorar. E, como bons porto-alegrenses, no primeiro verão
que apareceu, pegamos as mochilas e nos tocamos pra Garopaba. Montamos a
barraca na encosta do morro e ficamos namorando diante do mar. Um dia, inventei
de tomarmos banho nus numa prainha do outro lado
do morro, onde não havia viva alma. Imaginei que teria meu Woodstock particular
– as fotos do festival sempre destacavam os momentos de nudez, liberdade e
descontração –, mas ela não quis.
Era uma moça recatada e nunca quis “enfrentar o
sistema” nem tomar atitudes escandalosas. Woodstock não estava no seu horizonte
de fantasias, imagino. Nudez, só dentro do quarto ou da barraca. E lá fui eu
tomar banho sozinho – cumprindo a sina dos adolescentes que um dia conversaram
nas sacadas do Julinho e sonharam ser
“livre, leve e solto”, como dizia uma canção daquela época.
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