sábado, 3 de dezembro de 2011

Zona do Porto

Em Pelotas, morei na chamada zona do porto. Não propriamente junto ao porto, mas nas imediações. Se o leitor conhece a cidade, morei a duas quadras da Igreja do Sagrado Coração de Jesus (também conhecida como Igreja do Porto). Meu avô materno (nascido em 1897), este sim viveu a poucas quadras do cais. E, quando criança, ia com ele numa barbearia que ficava nessa zona, na Rua Benjamin Constant, próximo à ex-Cervejaria Rio-Grandense. Naquela época, completamente desativada.
Eu me sentava na porta da barbearia e ficava olhando aquele enorme conjunto de prédios, impressionado com o fato de que aquilo tudo um dia funcionara...
A cervejaria fazia parte do cenário da infância e juventude do meu avô, e lhe trazia boas recordações. Uma empresa pujante, que começara a funcionar em 1889, expandira-se na década de 1910 e ganhara aquelas dimensões arquitetônicas que eu via e admirava, na década de 1930. Segundo um levantamento atual, “um conjunto arquitetônico com volumetria bastante diversificada (...) toda ela marcada por uma heterogeneidade estilística”. Em 1944, foi comprada pela Cervejaria Brahma e fechada logo depois. Na década de 60, quando eu a conheci, estava rigorosamente transformada em ruínas.
A Brahma comprara a fábrica para calar a concorrência que ela fazia na região, ouvi contar. E nunca soube se alguma vez a Brahma a utilizou para produzir cerveja. Meu avô e os amigos – todos eles na faixa dos 60 anos – olhavam a imensidão das paredes da fábrica e apenas recordavam... Lembravam de quando eram jovens, a cidade parecia mais dinâmica, e eles iam a bailes e namoravam.
Quanto fui a Pelotas neste ano (para um congresso na UFPel), me dei conta de que o evento estava acontecendo num antigo estabelecimento industrial reformado, que fazia esquina com a Benjamin Constant. Não era a ex-Cervejaria Rio-Grandense, mas provavelmente um prédio remanescente daqueles tempos – daquele conjunto de prédios industriais que funcionaram na zona do porto na primeira metade do século XX.  
Então fiquei sentado na sala, escutando as comunicações acadêmicas e, súbito, tive a impressão de ouvir meu avô e os amigos. Eles falavam e riam, e imaginei que eles falassem das melindrosas, que todos namoraram com o devido respeito.
         Quando terminou o evento, era noite e dei uma breve olhada na Rua Benjamin Constant. Mas não avistei a ex-Cervejaria. Que sei continua existindo – eternamente em ruínas, conforme li numa reportagem sobre a cidade.

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