segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

Rio Grande Profundo

         As histórias contadas pelo vô Octaviano (meu avô materno) me colocaram em sintonia com as revoluções rio-grandenses: a Revolução Federalista, a Revolução de 1923, a Revolução de 30 e todo o ciclo de Vargas. O Vargas caudilho que tomou o Governo Federal em 1930, o Vargas ditador do Estado Novo e, principalmente, o Vargas que se tornou Pai dos Pobres, o Velhinho que volta ao poder em 1951 e peita os poderosos.
Claro que as histórias do vô não apontavam toda a cronologia e detalhes indicados acima. Isto eu aprendi depois, no Curso de História e quando me tornei professor. O que o vô fazia era simplesmente aproximar a criança que eu era da longa tradição guerreira e até revolucionária do Rio Grande do Sul – o Rio Grande histórico e também lendário.
Mais tarde, quando comecei a lecionar (em Alvorada e Canoas, no final dos anos 70 e início dos 80), os alunos me traziam a imagem de Vargas no mesmo diapasão das histórias do vô Octaviano. Os pais desses alunos lhes transmitiam a imagem do Vargas Pai dos Pobres, o estadista preocupado com o povo, e a gurizada não entendia o modo como eu tratava o ex-presidente. Afinal, como bom aluno da UFRGS e versado na sociologia paulista, eu enquadrava Vargas no conceito de populista e desmontava a figura do Pai dos Pobres. Vargas se tornava um líder que manipulava a classe trabalhadora e a impedia de agir de forma autônoma. A tal legislação trabalhista passava a ser vista como forma de controle da classe trabalhadora e lá se ia a imagem positiva do Doutor Getúlio. Ideias desenvolvidas por Octávio Ianni e Francisco Weffort, figuras emblemáticas da escola de sociologia paulista (USP) e até pouco tempo dominantes no mundo acadêmico.
E recordo que havia momentos, na sala de aula, em que eu me calava e ouvia os alunos falarem do Vargas que seus familiares desenhavam para eles. Nessas horas, era meu avô que eu escutava também.
Terminada a aula, eu saia a caminhar pela estrada de chão batido que passava na frente da escola e me sentia conectado com o glorioso ciclo das revoluções rio-grandenses. Um ciclo que precisava ser revisto, patati-patatá – mas isso não vem ao caso, agora. Meu avô morreu por aquela época (1982) e eu parecia regressar a um tempo primitivo escutando a fala dos alunos: as conversas meu avô sobre Vargas e uma plêiade de heróis rio-grandenses, do chamado Rio Grande Profundo.

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