sábado, 28 de janeiro de 2012

Farol de Santa Marta

Foi num verão da década de 1970. Estudantes, estávamos em férias e fomos passar uns dias em Laguna. Na verdade, numa pequena praia ao lado do farol de Santa Marta, nas imediações de Laguna. Lá montamos nossas barracas e dividimos nosso tempo entre a praia e um pequeno bar, que parecia enterrado entre as dunas. A região do farol ainda não era território de veranistas e o bar era voltado aos moradores de uma vila de pescadores.
Um desses moradores achou engraçado nosso visual de mochileiros e veio conversar conosco. Era um homem de 30 anos e fora marinheiro em navio mercante. Andara pelos portos da América Central, dos Estados Unidos e Europa. Chegara a ir ao Oriente e até conhecera o Japão. Aprendera inglês, espanhol, sabia palavras em japonês e tivera algumas mulheres – a melhor delas, uma japonesa, que conheceu num porto da Alemanha.
– Sabem o que é ter vontade de casar com uma mulher que trabalha na zona portuária? Pois é, coisa de louco. E eu quase cometi essa loucura, com a tal japonesa, vejam só!
Depois falou que estava de volta ao farol de Santa Marta, onde se criou, porque tivera um acidente. Um acidente de trabalho ou doença, não lembro direito, que o impossibilitava de viver embarcado. Não entrou em detalhes sobre o caso e seguimos bebendo calados. Uma tristeza enorme nublou seus olhos e acho que nem nos escutava.
No outro dia, ele nos avistou de longe, no bar, e nos saldou levantando o copo. Nós, guris da cidade, erguemos nossos copos e essa foi nossa última comunicação.
Será que ele sentia que estava enterrando a vida, aos 30 anos, numa vila de pescadores? Não sei. Acho que era um homem que aceitava o seu destino e pronto. Um pouco amargurado, mas aceitava.
Por um lado, nos indicava o que sonhávamos para nós mesmos – conhecer a amplidão do mundo: Panamá, Nova Iorque, Hamburgo, talvez Tóquio. Por outro, nos alertava para o que sequer imaginávamos: que alguma doença ou dificuldade poderiam nos amarrar junto ao cais e nos afundar em alguma aldeia.
Guris de 20 anos, à noite nós ficávamos olhando o facho do farol passar pelas águas do mar e era só aquilo que avistamos: a amplitude do oceano, o infinito das possibilidades de nossas vidas e a imensidão do mundo – que, até hoje, a maioria de nós não conhece.

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