Um amigo me ligou uma noite
dessas e contou que esteve no parque nacional de Fortaleza dos Aparados da
Serra. Ele passou pelo Itaimbézinho e depois foi até a beira do Malacara, para
ver o litoral de Santa Catarina. Mas acrescentou que o tempo estava ruim e que não
deu para enxergar coisa alguma.
Eu também nunca peguei tempo
bom nas bordas da Serra Geral. Na primeira vez – há quase quarenta anos –,
chovia e não vi grande coisa. As nuvens tomavam conta do cenário. Três anos depois, voltei, mas não cheguei até a encosta da Serra. Fiquei pelo meio do caminho e
acampei no Itaimbézinho, bem perto do canyon.
Nessa oportunidade, fazia um
tempo agradável e minha namorada e eu tomamos banho no arroio que deságua dentro
do canyon. Ficávamos em silêncio dentro da água, escutando os pequenos ruídos
que vinham da mata e o barulho da cachoeira, mais adiante.
Mas não desci o Itaimbezinho.
Nunca desci – como meu amigo fez mais de uma vez. Só fiquei olhando a paisagem
lá de cima – protegido – e o cenário ficou gravado nas minhas retinas. Jamais esqueci.
É uma das jóias que guardo dentro de mim. No ano passado, levei meus filhos
para conhecer o lugar e creio que eles se maravilharam.
Então meu amigo e eu comentamos
as novas regras do parque – a proibição de fazer fogueira e também de acampar –
e constatamos que as coisas mudaram. Foi a maneira que encontraram de preservar
o meio ambiente, ele disse. Nos últimos anos, a visitação aos Aparados se dá em
horário determinado e os visitantes se retiram ao entardecer. Rimos das
mudanças e sentimos saudades dos “bons tempos”.
Mudaram as formas de curtir a
natureza, concluímos. Está tudo mais organizado, talvez mais civilizado do que nos
anos 70, aqueles velhos tempos selvagens... Agora é com hora marcada e depois se janta em torno de uma mesa, numa pousada, e ainda se dorme em cama com colchão
e lençóis. Coisa muito fina para mochileiros.
E é legal desse jeito?,
perguntei. É sim, ele respondeu. A mulher não se queixa do chão duro da barraca
nem da falta de banheiro. Além disso, ele acrescentou, nem sei se conseguiria
dormir no chão novamente. Eu disse que também não sabia. As costas incomodam, o
reumatismo pegou. Já não sou mais o mesmo.
Então lembramos dos
lobos-guarás que conhecemos nos Aparados. Ou melhor, eu nunca cheguei a
avistar algum. Certa vez me acordei ao amanhecer, vi que a despensa estava
revirada e que alguns animais haviam atacado. Um bando de lobos-guarás, disse
um fazendeiro da região. Foi desse jeito que o animal passou a existir
para mim. Das outras vezes, quando montava o acampamento, sempre dava um jeito
de proteger melhor os alimentos.
Gosto de lembrar desses lobos, disse ao meu
amigo. Saber que na paisagem de Fortaleza dos Aparados os lobos-guarás sobrevivem
e não correm o risco de serem extintos – como tantas espécies pelo mundo.
Provavelmente devido às novas regras do parque. Pelo menos para isso elas servem.
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