quarta-feira, 1 de fevereiro de 2023

Os deuses Oceano e Tétis

 

Em setembro do ano passado fiz uma excursão pela Turquia na região denominada “Norte da Mesopotâmia”. Na cidade de Gaziantep (próxima à fronteira com a Síria) visitei o museu arqueológico local (Zeugma Mozaik Müses) e me surpreendi com os mosaicos romanos. Exibidos, por sinal, de forma muito original, recriando os espaços da antiga cidade romana de Zeugma, inundada pela represa de Birecik, no ano 2000.

Museu dos Mosaicos de Zeugma (Zeugma Mozaik Müses).

Entre as peças do museu, uma particularmente prendeu minha atenção: o mosaico dos deuses Oceano e Tétis. Originalmente uma peça colocada no fundo de uma piscina de casa romana (na cidade de Zeugma, nos séculos II e III d.C.), e hoje exibida numa parede.

Mosaico de Oceano e Tétis.

Na hora tive enorme dificuldade em reconhecer as figuras representadas, mesmo lendo a legenda ao lado (o texto em inglês, claro): o casal Oceano e Tétis, filhos de Urano e Geia, cercados por peixes e golfinhos, e também das figuras de Pan e Eros.

Oceano era o deus primitivo do rio que cercava a Terra (inicialmente pensada de forma plana, pelos antigos gregos), casado com sua irmã Tétis, a personificação do poder fecundo das águas; ambos da família dos Titãs, destronados mais tarde pelos deuses Olímpicos (liderados por Zeus). Oceano, apesar de não ter participado da Guerra dos Titãs, foi suplantado pelo poder de Poseidon (Netuno, na denominação romana) e seu reino deslocado para o Atlântico. Isso depois que os gregos ampliaram seus conhecimentos geográficos e descobriram o Oceano Atlântico e deixaram o Mediterrâneo sob o poder de Poseidon.

Um desafio e tanto compreender a mitologia greco-romana. Lembrei das aulas que por longos anos ministrei a respeito de História Antiga e constatei mais uma vez a precariedade dos meus conhecimentos. Que fazer, senão aceitar essa ignorância e deixar-se apenas deleitar-se com as peças exibidas?

O resto da visita andei mais despreocupado pelos mosaicos expostos, às vezes escutando a guia falar a respeito das peças, outras vezes me afastando do meu grupo de excursão e observando mais atentamente um e outro mosaico. Encantando (e intrigado também) com as representações de Dionísio, por exemplo, que a guia acentuara com entusiasmo.

Tentei, de fato, desprender-me das inquietações de velho professor História, mas não posso negar que ficaram me instigando as representações dos deuses Oceano e Tétis... Ele, com pinças de caranguejo na cabeça; ela, com asas da testa. Símbolos (as pinças e as asas) que não consegui nem consigo decifrar.

Ao voltar ao Brasil, consultei o famoso Dicionário da Mitologia Grega e Romana (DIFEL, 1993, 520 p.), de Pierre Grimal, e não houve jeito. A não ser reconhecer o que Grimal indica a respeito da mitologia: foi matéria viva no Mundo Mediterrâneo e, dessa maneira, se transformou ao longo do tempo e ganhou diversas feições, diferentes verdades.

Na antiga cidade de Zeugma, no tempo do Império Romano, Oceano e Tétis ganharam garras de caranguejos e asas nas suas cabeças e o que um professor latino-americano (que penou dando aulas de História Antiga, no outro extremo do mundo) pode querer a respeito do assunto? Apenas aceitar a sua ignorância e deleitar-se. Deleitar-se, principalmente. Deixar-se encantar por Oceano e Tétis e ser inundado pelo poder das águas.

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