A nova realidade latino-americana, isto é, as novas formas de intervenção política dos Estados Unidos na América Latina, está a exigir novos conceitos. O modelo que informava os golpes militares que destituíam governos nas décadas de 1960 e 70 - tanques nas ruas, prisões e cassações de adversários - está superado. Os novos golpes – como os de Honduras (2009), Paraguai (2012) e Brasil (2016) – seguem um outro padrão e talvez o conceito de guerra híbrida seja a melhor chave explicativa.
Uma guerra que não mais privilegia soldados num
território determinado, mas, sim, ações que visam “controlar ou moldar o comportamento dos organismos
inimigos sem destruí-los” - sem colocar tanques nas ruas e tropas cercando palácios de governo e congressos nacionais, como no modelo anterior. Uma guerra neocortical ou psicológica, como teoriza Richard
Szafranski, coronel norte-americano. Um novo tipo de ação político-militar estadunidense
que tem como objetivo o mesmo que os tradicionais golpes militares: intervir em
determinados Estados Nacionais, mudar os seus mandatários, ajustar as suas leis
aos interesses norte-americanos, mas, agora, com um grau de violência menor.
Os tanques militares ficam no pátio dos quartéis e basta um
twitter (como aquele do general Eduardo Villas Bôas, em 2018, ameaçando o STF caso
os ministros ajam de forma independente) para que o adversário político seja
escanteado (no caso do twitter citado, que Lula ficasse impossibilitado de
concorrer à Presidência da República).
Haja engenharia política para que uma coisa dessas
funcione! A essa engenharia, alguns teóricos estão chamando de Guerra Híbrida. Um
conjunto de ações que visam, em primeiro lugar, disseminar determinada visão
dos fatos (que uma companhia estatal é incapaz de gerir a riqueza petrolífera
recém descoberta, que a companhia está sendo alvo de roubo perpetrado pela
classe dirigente e que basta mudar isso – a Presidente e o grupo dirigente –
pra tudo se resolver). Para isso, pactuar com a grande imprensa (a disseminação
de informações é fundamental para moldar comportamentos, agir nas consciências
e vontades dos “civis”, a população-alvo), constituir “tenentes” (lideranças),
criar e financiar organizações (como MBL e Vem pra Rua), montar lobbys (como o
das companhias petrolíferas Chevron e Exxon, articulada pelo cônsul Dennis
Hearne, no Rio de Janeiro) e investir em “agentes nucleares”, como juízes
(Sérgio Moro), políticos (José Serra e Michel Temer), militares (Eduardo Villas
Bôas e Augusto Heleno) e policiais federais. Todas as organizações e
personalidades citadas com contatos com autoridades norte-americanas, muitos deles já comprovados
por documentos divulgados pelo WikiLeaks.
Escrevo isso porque terminei a leitura de um livro
de divulgação sobre o tema: O que você pensa que você pensa, não é você quem
pensa: a guerra híbrida no Brasil, de Marcelo Jugend (Curitiba, Editora
MouraSA, 2021). Um livro escrito em linguagem acessível com uma abordagem não isenta.
O título expressa um certo tom conspiratório, mas só para criar impacto e atrair
o leitor. A abordagem é razoável, com bons argumentos, pelo menos para quem
entende os Estados Unidos como potência econômica com projeto de dominação da América
Latina, incapaz de conviver com Estados Nacionais independentes e soberanos,
capazes de administrar e explorar suas reservas petrolíferas. Uma abordagem
razoável para quem apostou no Pré-Sal, na possibilidade de criar um novo Brasil
a partir dessa riqueza e por aí vai.
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