Em setembro do ano passado fiz uma excursão pela
Turquia na região denominada “Norte da Mesopotâmia”. Na cidade de Gaziantep (próxima
à fronteira com a Síria) visitei o museu arqueológico local (Zeugma Mozaik
Müses) e me surpreendi com os mosaicos romanos. Exibidos, por sinal, de forma muito
original, recriando os espaços da antiga cidade romana de Zeugma, inundada pela
represa de Birecik, no ano 2000.
Museu dos Mosaicos de Zeugma (Zeugma Mozaik Müses). |
Entre as peças do museu, uma particularmente
prendeu minha atenção: o mosaico dos deuses Oceano e Tétis. Originalmente uma
peça colocada no fundo de uma piscina de casa romana (na cidade de Zeugma, nos
séculos II e III d.C.), e hoje exibida numa parede.
Mosaico de Oceano e Tétis. |
Na hora tive enorme dificuldade em reconhecer as
figuras representadas, mesmo lendo a legenda ao lado (o texto em inglês, claro):
o casal Oceano e Tétis, filhos de Urano e Geia, cercados por peixes e golfinhos,
e também das figuras de Pan e Eros.
Oceano era o deus primitivo do rio que cercava a
Terra (inicialmente pensada de forma plana, pelos antigos gregos), casado com
sua irmã Tétis, a personificação do poder fecundo das águas; ambos da
família dos Titãs, destronados mais tarde pelos deuses Olímpicos (liderados por
Zeus). Oceano, apesar de não ter participado da Guerra dos Titãs, foi
suplantado pelo poder de Poseidon (Netuno, na denominação romana) e seu reino deslocado
para o Atlântico. Isso depois que os gregos ampliaram seus conhecimentos
geográficos e descobriram o Oceano Atlântico e deixaram o Mediterrâneo sob o
poder de Poseidon.
Um desafio e tanto compreender a mitologia
greco-romana. Lembrei das aulas que por longos anos ministrei a respeito de
História Antiga e constatei mais uma vez a precariedade dos meus conhecimentos.
Que fazer, senão aceitar essa ignorância e deixar-se apenas deleitar-se com as
peças exibidas?
O resto da visita andei mais despreocupado pelos
mosaicos expostos, às vezes escutando a guia falar a respeito das peças, outras
vezes me afastando do meu grupo de excursão e observando mais atentamente um e
outro mosaico. Encantando (e intrigado também) com as representações de Dionísio,
por exemplo, que a guia acentuara com entusiasmo.
Tentei, de fato, desprender-me das inquietações de
velho professor História, mas não posso negar que ficaram me instigando as
representações dos deuses Oceano e Tétis... Ele, com pinças de caranguejo na
cabeça; ela, com asas da testa. Símbolos (as pinças e as asas) que não consegui
nem consigo decifrar.
Ao voltar ao Brasil, consultei o famoso Dicionário
da Mitologia Grega e Romana (DIFEL, 1993, 520 p.), de Pierre Grimal, e não
houve jeito. A não ser reconhecer o que Grimal indica a respeito da mitologia:
foi matéria viva no Mundo Mediterrâneo e, dessa maneira, se transformou ao
longo do tempo e ganhou diversas feições, diferentes verdades.
Na antiga cidade de Zeugma, no tempo do Império
Romano, Oceano e Tétis ganharam garras de caranguejos e asas nas suas cabeças e
o que um professor latino-americano (que penou dando aulas de História Antiga,
no outro extremo do mundo) pode querer a respeito do assunto? Apenas aceitar a
sua ignorância e deleitar-se. Deleitar-se, principalmente. Deixar-se encantar
por Oceano e Tétis e ser inundado pelo poder das águas.
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