“Esquerda nunca mais, a população brasileira quer liberdade”,
me disse um bolsonarista convicto, antes da vitória do Lula. Um bolsonarista
que entende a coligação “Brasil pela Esperança” como expressão de uma
plataforma de governo contrária às liberdades políticas e às do mercado – a quem
eu escutei sem contestar, um pouco por educação, outro tanto para conhecer o bolsonarismo
da classe média alta. Um fenômeno e tanto. Dizendo-se bem informado, o meu
interlocutor acrescentou que o modelo de governar de Lula segue os exemplos de Fidel
e de Chávez.
Quando eu lecionava História da América Latina,
indicava o deputado Jair Bolsonaro como representação patética de uma direita
nostálgica da ditadura militar e da tortura como arma de combate. Uma direita
que eu entendia jamais voltaria a ter grande expressão política no Brasil e na
América Latina em geral.
Não preciso dizer que me enganei. Bolsonaro
escancarou o seu protofascismo – a sua homenagem ao coronel Ustra na votação do
impedimento da Presidente Dilma foi emblemático nesse sentido – e isso não
incomodou a direita brasileira. Pelo contrário, serviu como uma luva para a direita
tradicional (conservadora) e a direita neoliberal (adepta de pautas libertárias)
barrarem a moderada esquerda petista.
A direita brasileira não teve nenhum escrúpulo em
relação aos disparates autoritários do Capitão e, como bem expressou meu
interlocutor bolsonarista, o revestiu de uma aura de defensor das liberdades “frente
ao totalitarismo”.
Coisas da reformulação da direita mundial que eu
não soube compreender. Uma nova direita que rejeita o Iluminismo, desconfia do
Estado burguês como ele está construído e propõe uma reformulação selvagem do
Estado, da economia e da sociedade.
Escutando meu interlocutor bolsonarista convicto, me distraí separando as espinhas do peixe que almoçávamos (nas margens de um lago) e as colocando na beira do prato. Um esforço para não me engasgar com as espinhas e nem com o que escutava.
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