O Clube Comercial de Pelotas está em ruínas. Em abril
do ano passado (2022) estava caminhando pela Rua Félix da Cunha, avistei o
prédio... e levei um choque. A outrora bela marquise em estilo Art Nouveau, de
ferro e vidro, praticamente não existe mais. Parei na porta de entrada do clube
e o que vi foi uma cena de destroços. O antigo hall de entrada (com escada em
formato de Y e mármore de Carrara) transformado num quadro de bombardeio durante
a Segunda Guerra. Eu vinha acompanhando pela imprensa a degradação do clube,
mas não sabia que a coisa chegava a tanto.
Clube Comercial. Abril de 2022. |
Detalhe da marquise: apenas a estrutura de ferro, sem os vidros. |
Segundo artigo do jornalista Rubens Amador (no blog
Amigos de Pelotas), em fevereiro de 2020 o clube estava habilitado a captar recursos
da Lei de Incentivo à Cultura Estadual e da Lei Rouanet, mas o processo não
andou. A diretoria tinha interesse, disposição, mas não encontrava parceiros
que quisessem encarar o empreendimento. A maior parte do mobiliário (grande
parte nos estilos Luís XV, Luís XVI e Império) se perdeu (virou lixo nos fundos do prédio) e o acervo de obras artísticas (quadros de
Locatelli e esculturas de Caringi) foi transferido para o Museu Leopoldo Gotuzzo.
Diante dessa situação é de certa forma estranho
recuperar a memória dos bailes infantis de Carnaval realizados no clube, dos
quais participei da década de 1960. Olho a foto que postei na crônica anterior dos
meus irmãos e eu num desses bailes (ao fundo, um relógio de mesa
estiloso, provavelmente Luís XVI) e nos vejo como personagens de um mundo perdido
no tempo. Eu era uma criança desengonçada, vestida com apuro pela mãe e
conduzido por ela e o pai para um universo desconhecido, colorido e esfuziante, que até hoje
procuro decifrar.
Não me vejo pulando na pista de baile ao som de
marchinhas, mas apenas brincando pelo salão, jogando confete e serpentina e
também esguichando o líquido gelado de um lança-perfume. O pai nos abastecia
dessas peças carnavalescas (tubos de metal de lança-perfumes, sacos de
confetes e pacotes de serpentinas) e lá íamos nós.
Certa feita alguém me disse para esguichar o
lança-perfume no pescoço de uma moça sentada no outro extremo do salão e eu fui.
Guri boboca que era, cumpri a tarefa e a moça pulou na cadeira assustada, virou-se
para mim... e sorriu. Um sorriso esplendoroso que eu recebi estarrecido (“O que
eu fiz?”, devo ter pensado). Um episódio que, quando adulto, transformei na minha maior
conquista carnavalesca.
Eu tinha 8, 9 ou 10 anos de idade. Era um guri desengonçado (“Te solta guri, vai pular”, dizia a Tia Landa) e circulava num espaço que hoje é degradação e destroço. “Moradia de morcegos”, me disse um pelotense que não apenas ganhou sorrisos de moças deslumbrantes em bailes do Clube Comercial, mas abraços, beijos e, às vezes (raras vezes), um pouco mais do que isso.
Obs.: O lança-perfumes foi proibido, mas não sei quando. Li que isso ocorreu em agosto de 1961, pouco antes de encerrar o curto governo de Jânio Quadros. Acredito, no entanto, que a proibição não vingou, pois minha lembrança é de um período posterior (os carnavais de 1964, 65 e 66) e o lança-perfume rolava solto. Duvido que meus pais se contrapusessem a uma determinação da lei.
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